terça-feira, 24 de setembro de 2013

Gallo e a redução da maioridade no futebol

Gallo e a redução da maioridade no futebol
© FIFA.com
Olhando os rostinhos arredondados e os sorrisos de aparelhos no dentes, é difícil conceber, mas a ideia de que os jogadores da categoria sub-17 são adolescentes apenas começando a desenhar um caminho que pode ou não resultar no profissionalismo é coisa do passado - ainda mais num país onde o futebol tem a importância que tem no Brasil.
E o resultado disso, então, é que cada vez mais cedo esses rostinhos e sorrisos têm que se acostumar com serem reconhecidos na rua, serem cobrados por boas atuações e, quando servem à Seleção Brasileira, com carregarem a pressão dessa ideia de que, vestindo a camisa amarela de cinco estrelas, vencer é sempre uma obrigação. Duro, não? Pois Alexandre Gallo, técnico da Seleção sub-17, acha é ótimo.
“As fases para essas novas gerações foram antecipadas, e o processo, acelerado. Em países como o Brasil, o sub-17 é o novo sub-20: é lá que você encontra os jogadores que estão a um passo - a meio passo, na verdade - de estarem definitivamente integrados ao profissional”. Hoje eu convoco a sub-17 usando critérios que antes eram da sub-20: tenho que solicitar liberação aos clubes, que utilizam os garotos no time principal”, explica ao FIFA.com o treinador, que este ano assumiu o comando técnico da Seleção Brasileira nas três categorias de base: sub-15, sub-17 e sub-20. “Então, participar de uma Seleção, com essa idade, hoje significa muito mais do que antes. O garoto já é reconhecido pelo porteiro do prédio, já vê cobrança pelo resultado com a Seleção. Isso tudo gera pressão, claro. E, sabe o quê? É ótimo que gere e que o jogador já sinta isso cedo. Assim, percebe-se logo quem são os que têm as características para lidar bem com isso.” 
A base se profissionaliza e vice-versa A eloquência e a articulação com que Gallo descreve os processos das categorias de base parecem coisa de quem tratou disso a vida inteira, mas, de fato, é justamente o contrário: até este 2013, os 11 anos de carreira de treinador do ex-volante foram todos dedicados a equipes profissionais. No final das contas, um perfil que acaba sendo bem propício para tratar com uma molecada que cada vez mais cedo já vive assim, como adulta.
“Meu caminho é o inverso daquele da maioria dos técnicos, e acho que acaba sendo positivo. Eu trato a garotada com a mesma seriedade com que sempre fiz nos elencos adultos que treinei, e a resposta que tenho tido é bem boa”, conta Gallo, de 46 anos, cujo currículo inclui passagens como o título brasileiro de 2004, como auxiliar técnico de Vanderlei Luxemburgo no Santos, além de dois campeonatos estaduais, por Sport (2007) e Figueirense (2008), e uma Recopa Sul-Americana pelo Internacional (2007). “Minha intenção é mesmo a de profissionalizar cada vez as categorias de base, e isso faz ainda mais sentido quando você vê garotos como Abner (Coritiba), Gabriel (Santos) ou Kenedy (Fluminense), que já jogam e têm papéis importantes no elenco principal de seus clubes”, diz ele, fazendo referência a três garotos que estão em sua pré-lista de 26 jogadores que se prepara para a disputa da Copa do Mundo Sub-17 da FIFA, nos Emirados Árabes Unidos.
Obrigação de gente grandeO cenário descrito pelo treinador ajuda a dar sua resposta a uma questão frequente quando se discutem as categorias de base: o que importa mais, formar uma equipe vencedora ou pensar em formar valores – ainda que um ou outro – para o futuro? Sua visão é mais do que clara. “Eu sou o selecionador e tenho que escolher os jogadores que estão mais prontos para este momento. É impossível, a esta altura, entrar com a ideia de pensar no futuro. Até porque não existe nada que ajude a selecionar melhor, a filtrar, do que a competição; do que jogar para vencer. Este é o momento primordial com que eles têm que se acostumar para a vida toda.”
No caso do Brasil, “jogar para vencer” pode ser descrito como simplesmente “jogar”. A segunda parte está implícita. “No nosso caso, ainda tem isso: nascer brasileiro significa carregar esse fardo de, no futebol, ter obrigação de ganhar qualquer par ou ímpar. Contra a camisa amarela, quase todo time faz o jogo da vida. É ainda mais pressão. O bom é que boa parte deste grupo que vai aos Emirados é formado por gente que já conquistou o Campeonato Sul-Americano sub-15 em 2011. Eles estão acostumados”, analisa Gallo, que a esta altura já deixa bem claro que não se deixa enganar por rostinhos arredondados ou sorrisos metálicos. “Com esta meninada, está tudo bem claro: eles sabem que as coisas não são fáceis.”