sábado, 1 de janeiro de 2011

Treinamento no Futebol

Treinamento no Futebol


A FORMA DE TREINAR FAZ A DIFERENÇA.

Grandes investimentos em equipes de alto rendimento? Talvez! Mas acima de tudo entender as pessoas e saber gerenciá-las, tirando sempre o seu melhor para as estruturas

Autor: Professor Marcelo Duarte *

A forma de treinar faz toda à diferença, treinamento é tudo. Caso contrário não se chamaria treino. É neste momento que projetamos o jogo. Portanto os primeiros passos para termos sucesso é estarmos atentos e preparados para o que vamos encontrar no jogo, criar ferramentas para desenvolvermos um poder de concentração para a situação real encontrada no campo de jogo. . Concentração é um problema em muitos profissionais das mais variadas atividades. Mas ao mesmo tempo é fundamental para o êxito.

Antes de falarmos sobre a forma de treinar preciso confidenciar a importância da psicologia em meu método de trabalho. Fui obrigado a conhecer um pouco mais de consciente e subconsciente. Sem ela não conheceria os tais SER1 e SER2! Que aqui darei esta nomenclatura para estados consciente e subconsciente.
Esta dupla faz parte de nosso dia a dia constantemente e interfere diretamente em nossas ações.
O que venha ser estes dois elementos? O primeiro é analítico e conceitual. Compreende as regras do jogo. Dando ordens constantemente ao ser 2.
O ser 2 não fala, mas executa. Este é uma combinação complexa de pensamentos, sentidos, nervos e músculos que permitem o surgimento de qualquer atividade.
Um ser instintivo, que sabe como ninguém fazer a leitura do local e da situação em que se encontra desde que não seja lentamente morto.
O Ser 1 é egoísta, sendo tenso a todo instante. Sua sugestão é de não tentar. Neste ponto identifico a primeira barreira a derrubar nos atletas que trabalho. Estimulo a todo instante a tentar, assim reforço sua confiança e segurança nas ações a serem tomadas. “Tente sempre”!
O ser 2 tem haver mais com fé e segurança. Lembra do “tente sempre”?
As ordens do primeiro apenas confundem o segundo. Então como parar o ser1? Trabalhe sua confiança e segurança durante os treinos. Arrisque para aprimorar, para aperfeiçoar, para qualificar.
Acontecendo isto, o segundo eu atuará muito melhor e os resultados podem ser surpreendentes.
Não vou dar receita de bolo, vou colocar algumas iniciativas que tomo em meus treinamentos para dominar o ser1 e estimular o ser2.

Falo há muito tempo em aspectos comportamentais. Necessariamente preciso identificar o aspecto comportamental, ou se preferirem estrutura mental, de cada atleta para posteriormente apresentar o ser1 e ser2 de cada atleta.
Como faço isto? Aplico a situação mais próxima de jogo, para que possa vê-lôs no limite. Concentração, tomada de decisão, iniciativa, cooperação, imposição, interação e outras características são estimuladas com meus treinos.

Este jogo interior, que mais parece um quebra cabeças ou até mesmo um jogo de xadrez consiste em concentrar-se no aspecto principal de qualquer atividade. Esta concentração não obedece a uma ordem da vontade, mas sim a um estado de fascinação mental.

O ser1 por ser um conhecedor das limitações e dos medos acaba sendo um grande critico sem paciência. Nenhum pouquinho admirador da capacidade humana. O ser2 realiza tarefas cotidianas que requerem coordenação. Não desconfie deste ser2. Primeiramente requisitado em tarefas mais árduas, mas ficamos com medo de arranhar a nossa imagem pessoal não confiando neste segundo, não devemos considerá-lo inconsciente. Este é o problema! Ele é muito consciente. Sendo o primeiro a se manifestar em situação de pressão.

Faça ou não faça. Devemos concentrar nosso pensamento no que está ocorrendo e não naquilo que temos ou esperamos que ocorresse. A ansiedade é um temor que pode ocorrer no futuro, mas se atendermos ao momento presente as ações necessárias terão mais possibilidades de terem êxito.
A angustia pelo triunfo é mais perigoso que o ser1. Com o propósito de ganhar a qualquer custo o primeiro eu coloca em tensão músculos e nervos e freqüentemente causa equívocos.
O ser2 trabalha melhor quando o outro ser não encher de ordens impossíveis. Suprimindo o esforço consciente poderemos atuar com o esforço sem esforço. O ser 2 responderá com o máximo de seu potencial, ou seja, o total de suas possibilidades naturais mais o que aprendeu com a prática, experiência e materiais embarcados durante os treinos por nós treinadores.
Não deixe o ser 1 assumir o controle, questione.
O primeiro eu é pura teoria, o segundo é a prática. De importância ao segundo, deboche do primeiro, enquanto o segundo estiver fazendo a tarefa até o final.

Compreender os seus jogos interiores e suas ramificações vai melhorar a atuação de qualquer individuo no desempenho de uma tarefa especial. Percebo que o ser 1 tem a força e o respaldo da imaginação. Ele sempre está atento e ligado para contestar qualquer atividade de forma negativa e instalando dúvidas que aumentam a ansiedade e os nossos medos.
Todo confronto entre imaginação e vontade, o triunfo sempre fica com a imaginação. Até você reconhecer sua estrutura mental. Aquela que irá reger suas ações em situação de limite.

Como falei no inicio tinha que entender um pouco de psicologia e após identificar a importância do SER1 e SER2, era aplicar nos treinos a ponto de poder identificá-los nos atletas e fazer que todos da equipe pudessem desenvolver e estimular por completo as suas qualidades com confiança e segurança. Para isto nada melhor do que transformar o jogo num pequeno treino. Isto mesmo, não treino mais para o jogo. Todos os treinos são jogos. Todos os treinos são elaborados para que eu possa estar preparado para as mais variadas situações e assim não acontecer nenhum tipo de surpresa. Caso aconteça algum tipo de imprevisto os atletas estão treinados na sua confiança e seguros a ousar. Está confiança e segurança deve ser um estado da equipe. Tudo isto é treinado, situações contextualizadas ao jogo e ao adversário que irão enfrentar!

O que chamo de situação descontextualizadas ou contextualizadas? A situação mais próxima do jogo possível. Vai adiantar eu colocar um atacante a finalizar quase 100 bolas a gol num treino, ele e o goleiro, sendo que durante os 90 minutos está possibilidade é quase zero? No jogo eu terei oposição, adversário. Por isto preciso qualificar a capacidade de concentração, decisão, confiança e segurança do atleta. Ao deparar-se no jogo ele saberá muito bem o que fazer ou no mínimo irá recrutar as informações passadas para ele durante inúmeras seções de treinos.

Costumo dizer que o nadador quando treina vai para piscina nadar. O corredor quando vai treinar está na pista. O lutador no seu treino vai para o ringue e luta. O jogador tem que ir para o campo e treinar o jogo e suas situações. É mais prazeroso e você obtém um poder de concentração maior. Eu acabo cobrando uma postura mais próxima da perfeição em toda a situação. Estou no jogo e não posso perder a oportunidade quando surgir.
Hoje entendo porque alguns treinadores falavam que não acreditavam em sorte. Claro! A sorte só existe para quem está preparado quando a oportunidade surge.

Toda está complexidade funciona para a programação de meu trabalho. Isto inclui preparação física, técnica, tática e aspectos comportamentais.

Com formação em Educação Física sei muito bem de algumas valências importantes para um atleta de futebol. Resistência, força e velocidade. Mas obter a melhoria destas condições físicas em meu método de trabalho só com a inclusão de situação de jogo e sempre com bola. Monto um sistema tático com uma ou duas variações e desenvolvo em cima das características dos jogadores.
Exigência na perfeição do movimento e sua execução, com rapidez, agilidade e resistência para suportar a demanda do trabalho por determinado tempo. Alguma dúvida que não estou trabalhando valências físicas como resistência, força e velocidade?

Logo que iniciei no futebol feminino uma atleta me disse a seguinte frase ao final de um treino. “Professor este treino com bola e com está exigência é um super físico disfarçado.” Morri de rir internamente, mas tive a certeza que tinha atingido objetivo. Na oportunidade o nível do treino foi super alto e elas só perceberam no final com o chamado cansaço santo.

Agora faço uma pergunta: Seria possível está situação com tiros de 100 m ou 1000 m, longas corridas eu teria tido o mesmo aproveitamento nos aspectos concentração e situação contextualizada ao jogo? Eu não acredito! Neurologicamente que beneficio estou apresentando para a situação de jogo com este formato fora do contexto da partida de futebol? Estou estimulando o SER1 ou SER2? Estou dando confiança e segurança para o atleta na execução e aprimoramento dos movimentos, tempo de bola, ação e reação?
Repito, particularmente não acredito neste formato, embora durante muito tempo fosse adepto desta metodologia de treinamento físico.

O aperfeiçoamento tático também é levado nesta concepção. A grande mudança no meu entendimento é você ter uma equipe e todos os atletas saberem de sua importância para o sistema. Se eu tiver somente onze jogadores, quando um estiver lesionado, o sistema todo sofrerá com a mudança.
As peças mudam sem sofrer grandes alterações e ferir a mecânica de jogo, a cultura da equipe.
Claro que falando de complexidade, sistemas vivos e não lineares, ao colocar uma peça nova para o sistema rodar é evidente que teremos alterações. Mas lembre-se que nos treinos anteriores eu preparei as partes e o todo.
A equipe sabe quem irá jogar antecipadamente e com isto buscamos a modulação do sistema. Assim todos sabem e entendem a característica da parte e quem entra sabe a característica do todo.
Toda está situação não é elaborada da noite para o dia. Existe um padrão de treino que pode ser utilizado conforme o adversário, conforme a proposta de jogo que iremos apresentar. E todos os atletas sabem da proposta. Será novidade aos olhos dos outros e dos adversários não para nós.

Uma das ferramentas que utilizo é a reprodução exaustivamente das nossas movimentações táticas em cima dos adversários. Anular os pontos fortes e atacar nos pontos fracos. É uma opção, mas utilizar nossos recursos internos através de nosso Ser2 é o principal fundamento do meu método de trabalho. Qualquer movimentação tática fica fácil com uma boa resistência, força e velocidade de forma contextualizada. Não adiante eu realizar a parte física tradicional, como a do atletismo, que só serve para o atletismo e ao chegar à formação tática a bola ser um elemento estranho.

Atualmente a pré temporada nos clubes de futebol é muito curta, portanto desde o inicio do trabalho, após avaliação clinica e testes físicos normais para o inicio da temporada apresento bola aos atletas. A forma física vem com seu contato e com exercícios que atendam a necessidade de melhoria física, técnica em cima da base tática.

Você deve estar achando que me esqueci da evolução técnica. Claro que não. Confesso que tenho dificuldades em segmentar estes pontos. Eu visualizo tudo na sua totalidade. O Atleta por completo inserido num sistema, numa engrenagem complexa.
Então a evolução técnica se dá com o trabalho como um todo. A qualificação de domínio de bola, passe, finalização, cabeceio dois toques, movimentação intensa. Tudo isto está sendo aprimorado à condição técnica do atleta. Lembre-se que estou exigindo a perfeição, a precisão, confiança, segurança e concentração no treino. Reproduzindo no jogo o que trabalhamos. Jogo e treino tem que ter a mesma intensidade. Não há mais tempo para grandes experiências no futebol. A sustentabilidade de uma equipe se dá através de resultados positivos e títulos. A regra é treinamento de jogo no jogo.

A idéia deste treinamento é aproximar ao máximo a realidade do jogo no treinamento. É neste momento que as falhas aparecem e podemos corrigir. É nesta situação de mais proximidade da realidade do jogo que vejo o perfil do atleta, se ele poderá corresponder à expectativa da equipe, se ele está seguro ou não e o mesmo serve ou não para equipe. No jogo nada deverá ser surpresa. Tudo tem que ser natural.
Costumo dizer que como treinador, eu não ensino nada, apenas estimulo as qualidades do atleta. Quero despertar valores no atleta e fazê-lo o melhor. A pessoa certa para o local certo!
Por isto que acredito nesta forma de treinar. Uma forma contextualizada. Uma forma próxima da realidade do jogo. Uma forma sempre com intensidade na realização das atividades, na cobrança pela perfeição e pela concentração na execução da atividade em questão.

*Marcelo Duarte é preparador físico do Porto Alegre FC.
Criador do método “Alpinista – A liderança Guiada”.
E-mail: marceloduartesports@gmail.com